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Em tempos escrevia em guardanapos e sacas de batatas
escrevia por uma esperança vaga
hoje é-me difícil escrever numa terra sem papéis e canetas
em redes sem rede, no mar alto em que nos afogamos
alegremente em conjunto

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quando ia para o carro, tirei a t-shirt porque estava calor
pareceu-me natural

mas o natural só é natural em locais previamente aprovados (por quem?)

tirar a t-shirt num jogo de futebol é normal
na rua não é

tirar a t-shirt num concerto de musica rock é aceitável
se for musica classica não é

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gosto disto pelo motivos menos óbvios, admiro quem faz o que não se vê

quando era puto a malta que levava saco ou mochila para a praia, procurava que a mochila fosse gira e com estilo
havia um gajo que levava as coisas num saco do pão do acúcar, se fosse preciso com buracos
todo ele era desprendimento

mais tarde apercebi-me que não era desapego, era pose. o saco do pão de acúcar era para ser visto
a preocupação pelo estilo era igual

neste video, para além do punho erguido
gosto de coisas como ele se desencontrar da própria sombra

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Como tudo na vida, os restaurantes também têm um ponto de equilibrio
Ser o único resulta em que os empregados não têm mais nada para fazer que olhar para mim
é desconfortável
O outro extremo é estar tanta gente que para pedir a conta é preciso pôr-me nu em cima da mesa

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estiveram aqui dois pombos enrolados, aquilo eram bicadas eram golpes de asa
foi intenso, mas fiquei sem saber se foi zanga ou amor
não me atrevi a ir perguntar

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Um dia, quem sabe

Um dia, quem sabe,
ela, que também gostava de bichos,
apareça
numa alameda do zôo,
sorridente,
tal como agora está
no retrato sobre a mesa.
Ela é tão bela,
que, por certo, hão de ressuscitá-la.
Vosso Trigésimo Século
ultrapassará o exame
de mil nadas,
que dilaceravam o coração.
Então,
de todo amor não terminado
seremos pagos
em inumeráveis noites de estrelas.
Ressuscita-me,
nem que seja só porque te esperava
como um poeta,
repelindo o absurdo quotidiano!
Ressuscita-me,
nem que seja só por isso!
Ressuscita-me!
Quero viver até o fim o que me cabe!
Para que o amor não seja mais escravo
de casamentos,
concupiscência,
salários.
Para que, maldizendo os leitos,
saltando dos coxins,
o amor se vá pelo universo inteiro.
Para que o dia,
que o sofrimento degrada,
não vos seja chorado, mendigado.
E que, ao primeiro apelo:
– Camaradas!
Atenta se volte a terra inteira.
Para viver
livre dos nichos das casas.
Para que doravante
a família seja
o pai,
pelo menos o Universo,
a mãe,
pelo menos a Terra.

Um dia, quem sabe
seremos pagos
em inumeráveis noites de estrelas.
E que doravante
o pai seja pelo menos o Universo,
e a mãe pelo menos a Terra.

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Hoje falei e falei para o telemovel já sem bateria. Chorei e fui feliz. Foi bom.
O que isso conta em relação ao grande esquema das coisas? Nada de especial.
A bola chutada pelo pé do ronaldo ir um centimetro para a esquerda ou para a direita, gasta litros de tinta e saliva em comentadores televisivos.
O meu ou o teu choro? Menos que pó num poste perdido algures na África do Sul.

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tirando os olhos que tendem a falar
e a boca que tende a olhar

tirando os olhos que tendem a fechar
e a boca que tende a abrir

tudo sul a norte do oeste

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