Como um dos exemplos da garra que lhe era característica (serena mas com fúria, diz quem a conheceu) conta-se que certa vez, quando foi revistada por uma PIDE chamada Madalena, que lhe despejou a mala, disse-lhe: “Agora volte a pôr tudo lá dentro.”
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Deixo outro poema, que não tenho a certeza de ter como título “Às vezes as coisas dentro de nós”:
O que nos chama para dentro de nós mesmos
é uma vaga de luz, um pavio, uma sombra incerta.
Qualquer coisa que nos muda a escala do olhar
e nos torna piedosos, como quem já tem fé.
Nós que tivemos a vagarosa alegria repartida
pelo movimento, pela forma, pelo nome,
voltamos ao zero irradiante, ao ver
o que foi grande, o que foi pequeno, aliás
o que não tem tamanho, mas está agora
engrandecido dentro do novo olhar.
Como o assunto é poesia e pessoas bonitas, recordo que nesta data o Eugénio de Andrade faz (não é faria ou fazia) noventa e cinco anos.
E foi precisamente neste dia que descobri, através de uma entrevista, o poema que ele preferia de todos os que escreveu, que é:
Memória dos dias
Vais e vens na memória dos dias
onde o amor
cercou a casa de luz matutina.
Às vezes sabíamos de ti pelo aroma
das glicínias escorrendo no muro,
outras pelo rumor do verão rente
ao oiro velho dos plátanos.
Vais e vens. E quando regressas
é o teu cão o primeiro a sabê-lo.
Ao ouvi-lo latir, sabíamos que contigo
também o amor chegara a casa.
Como um dos exemplos da garra que lhe era característica (serena mas com fúria, diz quem a conheceu) conta-se que certa vez, quando foi revistada por uma PIDE chamada Madalena, que lhe despejou a mala, disse-lhe: “Agora volte a pôr tudo lá dentro.”
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Deixo outro poema, que não tenho a certeza de ter como título “Às vezes as coisas dentro de nós”:
O que nos chama para dentro de nós mesmos
é uma vaga de luz, um pavio, uma sombra incerta.
Qualquer coisa que nos muda a escala do olhar
e nos torna piedosos, como quem já tem fé.
Nós que tivemos a vagarosa alegria repartida
pelo movimento, pela forma, pelo nome,
voltamos ao zero irradiante, ao ver
o que foi grande, o que foi pequeno, aliás
o que não tem tamanho, mas está agora
engrandecido dentro do novo olhar.
Fiama Hasse Pais Brandão | “As fábulas”
Como o assunto é poesia e pessoas bonitas, recordo que nesta data o Eugénio de Andrade faz (não é faria ou fazia) noventa e cinco anos.
E foi precisamente neste dia que descobri, através de uma entrevista, o poema que ele preferia de todos os que escreveu, que é:
Memória dos dias
Vais e vens na memória dos dias
onde o amor
cercou a casa de luz matutina.
Às vezes sabíamos de ti pelo aroma
das glicínias escorrendo no muro,
outras pelo rumor do verão rente
ao oiro velho dos plátanos.
Vais e vens. E quando regressas
é o teu cão o primeiro a sabê-lo.
Ao ouvi-lo latir, sabíamos que contigo
também o amor chegara a casa.
Eugénio de Andrade | “Os Sulcos da Sede” (2001)
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Achei curioso e gostei dessa espécie de espanto que senti.