Eu não estou mas a minha empregada está, ela abre a porta
Não lhe posso dizer, tem que falar com o gerente
Quando ouvi a primeira frase, lembrei-me do estranho que soaria ouvir ‘o meu empregado está, ele abre a porta’.
Só haverá igualdade de géneros quando deixar de ser estranho.
Mas existe uma outra desigualdade, de que é proibido falar, a de classes.
Que só deixará de existir quando for tão honrado fazer trabalho manual de limpeza como ser gerente de uma qualquer coisa.
De cada um segundo as suas capacidades. A cada um segundo as suas necessidades.
ah, Luís, isso é tão, mas tão verdade…
Tantas vezes eu próprio já perpetuei essa desigualdade que tenho entranhada em mim.
Quando preciso contratar alguém para limpeza, e falo com pessoas conhecidas, pergunto: sabes de alguma empregada?
temos isso debaixo da pele…
e por isso é difícil de sair
o primeiro passo é conseguir reconhecer o mal
sim… por não saber bem como lidar com esse incômodo, acabei construindo uma vida onde não incluo essas relações… o que não é bem uma solução
de certa forma é solução
de certa forma…
E é preciso haver igualdade de género?
À partida, esse soar estranho de que falas não é discriminação negativa, não tem que ver com rebaixar ninguém, mas sim com o menor número de pessoas de cada sexo a desempenhar essas funções.
Há trabalhos em que a condição física de se ser homem ou mulher conta mais. Aqueles que exigem força, por exemplo.
Estou a lembrar-me do preso por ter cão, preso por não ter.
Se estiver num sítio com homens e mulheres, e precisar de ajuda para carregar caixas pesadas, pergunto primeiro a um homem ou dois se podem ajudar. Faço e continuo a fazer porque é mais fácil para eles.
Se fizesse o contrário, era provável ouvir ‘com homens aqui, e estás a pedir às mulheres; os homens tens de servir para alguma coisa’
Ah, dizias para o geral. Não digo pelo compasso de espera, pelo incómodo daquela indecisão que já se sabe no que vai dar, elas a olharem para eles enquanto perguntam vais lá tu?, eles a olharem para elas enquanto dizem posso lá ir, etc.
Há uma loja de arranjos de roupa no Colombo que trabalha muito bem.
Achei graça numa das vezes que lá fui buscar as coisas, uma empregada dizer-me com muita ênfase ‘olhe que foi aquele senhor ali que tratou do seu vestido, desmontou-o quase todo e deixou-o impecável; é costureiro e veio trabalhar connosco’.
Isto pode ter duas leituras, pelo menos.
não tem que haver igualdade de géneros e ainda bem, senão ainda arranjam maneira de não se poder diferenciar entre ir para a cama com homem ou mulher 😀
a questão está ligada com outra mais importante, e que para essa não há quotas, não há institutos, nem defesas, as classes
há pois é! existem classes, e existe luta. e os trabalhadores estão a perder em toda a linha, tanto que nem se apercebem que estão a perder por 50 a 0
há profissões que têm estigma. Há profissões que a malta ostenta com orgulho, outras que se diz com embaraço.
E as profissões que pior vistas, são as piores pagas. E as mais nobres são as que pagam muito bem.
E é claro que devia ser ao contrário. As profissões chatas e mal vistas devem ser bem recompensadas.
Mas lá está, quem tem a decisão fica com o poder, o prestígio e o dinheiro, porque há sempre quem para não morrer á fome tenha que se sujeitar a tudo por 500 euros.
E isto está ligado ao género, porque muitas (não todas, claro) destas profissões mal pagas, cansativas e desvalorizadas estão destinadas a mulheres.