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Onde não puderes amar não te demores

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porra foda-se deus não não pode existir que eu não mereço isto

9 comments

  1. Não existe e tu não mereces aquilo. Para amar é necessário uma camioneta que leve muita areia

  2. e um baldinho e pá para brincar

  3. Se soubermos que num lugar / circunstância não pudermos amar, o melhor é nem nos abeirarmos. Normalmente, só se percebe depois de lá estarmos.

    Deus não existe. Uma construção das religiões e seitas. Um negócio brutal à volta disso.
    O merecer ou não em nada tem que ver com entidades consideradas superiores.
    O argumento “deus” é um pau de dois bicos. Há cerca de quatro anos escrevi um texto sobre isso, na forma de história, baseado em dois episódios de vida verídicos de duas pessoas, o qual já tinha sido tornado público e por isso estou mais à vontade para o trazer aqui.. É um pouco longo, mas deixo-o na mesma:

    [Título: “Deus existe?”

    – Aquilo dos pássaros foi mesmo verdade?
    – Sim, ela tinha lá o livro e disse que viu penas aos pés da cama.
    – Ah! É que eu na altura parece que não dei importância e agora ando a pensar nisso.
    Comecei o ano a remexer em coisas. Dias antes do julgamento, reli e reli o teu texto. É que desde aquele acontecimento, a dúvida se deus existe anda a atazanar-me quase todos os dias. Depois vieram os sustos com a saúde e a dúvida acompanhou-os. Tenho a impressão que tudo seria mais fácil se acreditasse. Às vezes acho que deve existir uma força superior a nós. Ou será que me daria mais jeito que existisse, para me desculpar mais? Não sei mesmo o que te diga sobre deus.
    Também não sei explicar-te o que me leva a pensar todos os dias naquela rapariga, uma rapariga que não conheci. (Tu tens a certeza que ela continua bem?) Ela acredita em deus e parece-me que isso a conforta. Eu não sei se acredito, mas conforta-me pensar que se ele existir, acho que gosta muito de mim.
    Tu também pensas nestas questões? Pelo menos de vez em quando não esbarras neste confronto entre ti e a possibilidade de haver alguma coisa acima de nós?
    – É assim mais ou menos como tu.

    – Há dois dias que consigo adormecer com a luz apagada.
    – Olha, vês, que bom.
    Senti-me bem por o ter conseguido e por te ter dito. Íamos a subir aquelas escadas que dão para o miradouro. Lembras-te?
    Desligar o candeeiro foi o acto simbólico que escolhi para me ajudar a encerrar um capítulo cinzento. Na primeira noite, e à semelhança do que me aconteceu em criança por causa de um cabide de pé que havia atrás da porta do quarto, defendi-me com a (re)descoberta de alguma luminosidade que vem da varanda. E tem sido assim todas as noites porque custa apagar dois anos de uma só vez. Não cedi à tentação. Não pode ser. Prefiro esmagar o olhar no cortinado.
    Para além do simbólico, e ao contrário do que previa, não senti alívio. Pelo menos de forma entusiástica. Apeteceu-me e apetece-me muito o silêncio sobre este assunto. Parece que tenho necessidade de calcar diariamente alguma coisa aqui dentro até que se desvaneça mais. Contigo não me importo de falar sobre isto… Até estou a escrever. Talvez por isso, se calhar eu deveria demonstrar mais agradecimento às pessoas que me ajudaram. Mas este tempo de interrogatórios deixaram-me exausta. Tive que repetir muitas vezes as mesmas frases e ter muito cuidado para manter a coerência e a segurança. Sabes, aquela sensação de um eco que nos persegue num labirinto?

    – Mãe, como é que foi?
    – O gajo foi dentro. Nove anos. Tenho cópia da sentença… Depois vês, se quiseres.
    – Mãe, choraste?
    – Não, não era o tempo e o lugar para chorar.
    – Está bem, mas podias ter vontade e não conseguir evitar.
    – Não, não tive vontade. Eu tinha a certeza que ali a parte racional se sobrepunha.
    – E agora, mãe, tens vontade? O que é que tu sentes?
    – Agora também não tenho vontade e não consigo sentir nada. Não te preocupes porque eu estou bem. Só quero descansar um bocadinho. Depois falamos mais.
    – Oh mãe, mas correu bem. Devias estar satisfeita.
    – O que estou é mesmo muito cansada.

    E foi a partir daqui, dos dois momentos no tribunal, e também para mim de forma surpreendente, que a indiferença que eu dizia sentir em relação àquele homem se foi transformando em raiva. Aquele olhar à saída da sala de audiências e o gesto de me querer cuspir na cara ao mesmo tempo que era algemado, funcionou como um ponto de viragem. Uma viragem também noutra perspectiva: a parte da violência física, que eu sempre afirmei como a mais penosa, passou para segundo plano. O corpo daquele homem a esfregar-se em mim tornou-se na zona mais fria e nojenta. Muito provavelmente a memória mais difícil de trabalhar. Como as coisas são. Talvez por isso me apeteça tanto o silêncio. Eu queria que não tivesse existido um corpo que eu não escolhi a roçar-se em mim. Eu não queria ter sido obrigada a passar as mãos por um corpo que eu não escolhi. Mas o tipo ameaçou-me de morte. O que é que eu podia fazer?

    – Lembras-te como fiquei? Acho que tu tentaste disfarçar.
    – Mais ou menos já vinha preparado quando recebi o sms e ao telefone percebi que não conseguias falar. Claro que eu não podia mostrar-me impressionado, mas agora digo-te que era impossível não estar.
    – Eu sei. Mas eu não queria que tu tivesses pena de mim.
    – Compreender e ajudar é diferente de ter pena. Vá, não te preocupes. Sei o que queres dizer…

    Já dei comigo no banho a ensaboar-me muito, para ver se sai. Já dei comigo a cuspir, para ver se me desfaço do cabrão. A seguir sinto sempre muito frio. Fala-se pouco disso, talvez por pudor, e não é muito bem explicado nos livros, mas a verdade é que a vontade de um corpo quente que se escolhe, pode aumentar. Só se fala da rejeição, dos traumas que andam por aí.
    Olha, ainda bem que o tipo está preso. É que eu acho que havia de arranjar maneira de acabar com ele e desgraçava a minha vida. Vês no que isto deu?
    Se eu voltar a falar no assunto, vou usar um tom mais baixo, está bem? Pelo menos nos próximos tempos.
    Felizmente, porque muito menos complicado, não tive tempo de ver pássaros, penas ou coisa alguma. Mas tanto eu como a tua amiga teríamos razões para acreditar ou não na existência de deus. Se ele existisse, não me teria acontecido, diríamos. Ou então, podíamos pensar que se ele não existisse já não estaríamos cá.
    – Achas que deus existe?
    – Vem daí.]

    1. O primeiro paragrafo podia ser meu 🙂
      Ia refutar a primeira frase quando vi que na segunda frase, fizeste isso mesmo.

      Deus não existe mas é pena. Era porreiro, desde que fosse diferente desse de que falam por aí, que é chato e mau.

      Lá está, dava jeito para resolver todas as merdas que os humanos fazem.

      Engraçado, que não existindo é tão importante para todos, mesmo para quem não acredita:

      É o não existente mais existente que há.

  4. És um idiota.

    1. Já sabia, obrigado.

  5. Não há nada tão bom como anónimos. Amo-os. Tenho mesmo paixão.

    1. São queridos.
      Quem se dá ao trabalho de comentar algo que escrevi é porque se importa, e por isso é-me querido.

      Reparei que não agradeço muito quem me visita. Gosto das vossas visitas.

      Não são a razão dos meus desvarios e despautérios, mas aquece o coraçãozinho aqui do je..

  6. Onde não posso ou onde acho que não posso?
    Porque eu posso poder e achar que não posso e posso não poder e achar que posso.

    Vou parar com os comentários por hoje. Ler-te de enfiada já me está a transtornar. 😀

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