Se da antiga chama
Mal vive a amargura
Duma mancha negra
Duma pedra fria
Que amor não se entrega
Na noite vazia?
E as vozes embarcam
Num silêncio aflito
Quanto mais se apartam
Mais se ouve o seu grito
Muito à flor das águas
Noite marinheira
Vem devagarinho
Para a minha beira
Em novas coutadas
Junta de uma hera
Nascem flores vermelhas
Pela Primavera
Assim tu souberas
Irmã cotovia
Dizer-me se esperas
Pelo nascer do dia
Para rematar um doce. Perdão, uma tosta mista.
Estes são os mistérios da natureza, porque é que gosto tanto desta música, e não de outras
Porque é que sinto o que sinto quando a ouço, que reacções físico-químicas acontecem na minha cabeça?
E porque acontece comigo e não com outros? Onde anda a ciência quando a gente precisa dela?
Sei que rumo esta conversa iria levar, vou mas é trabalhar
rima e é verdade
O Arlo Guthrie tem uma música hilariante onde diz que não se pode ter uma coisa sem outra,
‘You can’t have a light without a dark to stick it in.’
Toda a gente está contra o trabalho infantil, contra as condições de trabalho desumanas que se praticam em muitos países asiáticos nas sweatshops.
Muitos trabalham desde os 9 anos, 12 horas por dia, 7 dias por semana por um salário de 20 euros por mês.
Estamos contra, isso é bom e lava a consciência.
No dia seguinte vamos todos contentes comprar um top à Primark por dois ou três euros. Basta pensar um bocadinho para ver como tal é possível. E lá vamos andando com as nossas hipocriasiazinhas. Somos contra, mas tiramos partido disso, e perpetuamos a situação.
A Uber é a mesma coisa. Sabe-se que o modelo de negócio assenta na precariedade laboral, também chamado de dinamismo. No entanto todos os dias é passada a ideia que a Uber é moderna, é o sucesso, é o futuro. Rico futuro.
Como consumidores a gente finge, ou evitamos pensar, que a luz em que vivemos não deixa ninguém ás escuras.
E aqui deitado, vou antes escrever sobre bares e cafés.
Chegou um estranho individuo. De fato e lambreta, podia ser mais um ricaço relambido. Mas não, o ar perdido e a carteira de miúdo, puseram-me a pensar nos que conheci. Nos que morreram, nos que enlouqueceram e nos que foram.
No final do almoço numa mesa ao lado falavam em algo relacionando che guevara e pablo neruda e no sonho duma América latina unida. E olhei para a sensaboria sem fim em que me transformei. Mas sinto que sou o mesmo.
‘Passeio calmamente, com olhos, com sapatos,
com fúria e esquecimento,
passo, atravesso escritórios e lojas ortopédicas,
e pátios onde há roupa pendurada num arame:
cuecas, toalhas e camisas que choram
lentas lágrimas sórdidas.’
‘Todavia, seria delicioso
assustar um notário com um lírio cortado
ou matar uma freira com um soco na orelha.
Seria belo
ir pelas ruas com uma faca verde
e aos gritos até morrer de frio.’